Moro em frente a um supermercado. Tenho 1,92 metro de altura.

O que uma coisa tem a ver com a outra?

Tudo. Porque nunca falha. Todo ano, uma semana depois do Carnaval, o mercado do outro lado da rua instala caramanchões de ovos de Páscoa nos corredores. Tetos rebaixados, feitos de chocolates ovoides e papel celofane. Bloqueiam a luz e me obrigam a caminhar curvado para não bater o cocuruto.

O meu supermercado se converte em território hostil durante a Quaresma.

A única coisa legal é quando as pessoas pequenas – velhinhas, geralmente – me pedem para pegar um ovo no alto da estrutura. Gosto de me sentir útil.

Mas deixemos de lado minhas agruras quaresmeiras para falar dos ovos de Páscoa em si. Comprá-los é um dos piores negócios que uma pessoa pode fazer.

Tomo por exemplo um ovo muito, muito básico, sem ganache de Armagnac nem cacau orgânico de Timor Leste: o ovo de chocolate ao leite Nestlé. Não é implicância com essa empresa em particular: a Nestlé foi a primeira a plantar ovos no meu supermercado neste ano. As outras marcas, grandes ou pequenas, seguem o mesmo padrão.

No meu supermercado, um mísero ovinho de 45 gramas custa R$ 10,95. São R$ 0,24 por grama ou R$ 240 por quilo – nem a cantina mais ladra de São Paulo tem a manha de cobrar isso por peso no bufê de antepastos.

Logo ali, num corredor que ainda não foi tomado pelos invasores ovoides, encontra-se exatamente o mesmo chocolate a R$ 0,05 por grama ou R$ 50 por quilo. Só que vem na forma de uma tediosa barra, retangular como toda barra de chocolate.

Ou seja: paga-se quase o quíntuplo pelo mesmo produto, no mesmo ponto-de-venda.

Sei que meu artigo anterior falava da importância da indústria alimentícia, numa defesa meio reticente. Sei mais ainda que esses caras são finórios. Ladinos. Malandros. Amigos, o ovo de Páscoa é um enorme embuste sazonal para turbinar os bônus dos executivos do setor.

Mas é o Grinch da Páscoa. Blogayro, influencer e Grinch, dirão.

Não me veja assim. Também sou pai de um menino de 5 anos que ainda acredita na existência do coelho da Páscoa.

Ele vai ganhar um ovo. E acho que todos devem dar ovos de Páscoa para suas crianças. Sugiro o ovo mais ordinário possível, pois a qualidade do chocolate é o que menos interessa para elas.

Agora, dar ovos de Páscoa para adultos infantilizados não tem cabimento.

No ano passado, um ovo de Páscoa gurmê chegava a custar R$ 300. Dá para comprar uma passagem de avião (uma perna, doméstica e em promoção, mas dá), um champanhe ou dez meses de Netflix.

Se formos limitar a comparação ao chocolate, um ovo de 185 gramas da Nestlé (R$ 37) custa quase o mesmo que duas barras de chocolate Amma 75% (R$ 19 cada, 80 gramas cada), feitas com cacau baiano de origem aristocrática.

Muito amargo, não é o espírito da Páscoa. Concordo. Confesso que chocolate ao leite também é mais a minha praia.

Aí temos a barrinha de 100 gramas da Lindt, deliciosidade suíça embrulhada em papel encerado azul, por R$ 20,50 – e olha que o meu supermercado enfia a mão neste item em particular. Ainda assim, o preço por grama é de R$ 0,20. Quatro centavos a menos do que o ovinho da Nestlé.

Se você quer pagar para entortarem o seu chocolate, o problema é seu.