Abacate salgado: sim, não ou nem sob tortura?

Por obrigação profissional e curiosidade pessoal, acompanho a evolução das modinhas gastronômicas desde o surgimento do tomate seco. Conheci o danado em um supermercado do interior dos Estados Unidos em fins de 1991; quando voltei ao Brasil, seis meses depois, presenciei a progressão geométrica de uma epidemia que atingiu até o último pedaço de pizza.

Essa é a dinâmica dos surtos alimentares dos abonados/descolados: aparecem em algum ponto obscuro de Nova York ou Berlim antes de conquistar os países que, em tempos anteriores ao politicamente correto, compunham o chamado Primeiro Mundo. Chegam ao Brasil na terceira onda e são prontamente avacalhados.

Foi assim com o lámen, o hambúrguer gourmet, a pizza napolitana, o negroni e a cerveja artesanal.

A internet facilita muito o rastreamento do fenômeno. Sites voltados para hipsters vivem de caçar tendências e inventar outras quando não há nada de novo e relevante – a superexposição cria profecias autorrealizáveis.

Mas confesso que fui atropelado pela modinha da torrada com abacate – chamada no mundo anglófono de avocado toast ou simplesmente avo toast.

De uma hora para outra, meu feed do Instagram foi inundado por fotos de pão com abacate. “Qual é a dessa gente maluca?”, pensei. Fui pesquisar.

Descobri que a avo toast virou moda na Austrália, ganhou o Reino Unido, depois o resto da Europa e os Estados Unidos, espalhando-se como uma praga até as lonjuras da China, onde o abacate ganhou a alcunha de “fruta-manteiga”. A explosão da demanda pelo fruto inflou seu valor de mercado. A coisa ganhou uma dimensão bizarra – ao ponto de atrair o interesse dos cartéis do narcotráfico, que assumiram a gestão dos abacatais do México.

Isso vem rolando há dez anos ou mais. Como eu pude ficar alheio por tanto tempo? Tenho duas teorias:

  • A moda pegou majoritariamente entre os veganos e os marombeiros – duas comunidades que não me falam ao coração.
  • A avo toast realmente custou a chegar (e a ganhar adeptos) ao Brasil, graças à nossa peculiar cultura de comer abacate.

Somos um dos poucos países em que o abacate é reconhecido como uma comida doce. Pratos salgados com a fruta – até mesmo a mundialmente popular guacamole – têm pouca adesão por estas bandas. Nosso negócio é creme de abacate com limão e açúcar.

Será que a torrada com abacate vai vingar? Ou será mais uma modinha a morrer entre meia dúzia de hipsters?

E você? Encara o abacate salgado?