No frio, seja cafona e feliz com fondue de queijo
Sorry, Cuiabá, mas o frio chegou a São Paulo: é tempo de FONDUE.
Antes de mais nada, a palavra “fondue” é menina. A fondue, pronunciada “fandu”, não “fondi” – escrevo isto enquanto seguro a xícara de chá com o mindinho em riste. Acho horrível, mas o rigor jornalístico me obriga a escrever as coisas da forma certa. A palavra é francesa, e em francês é feminina.
O fondue, perdão, a fondue já foi considerada muito chique aqui no Brasil. Lá nos anos 1970, não havia programa mais bacana para se fazer no inverno, à frente da lareira, na companhia de uma garrafa de Chateau Duvalier.
Mas caiu em desgraça no universo “foodie”. Espetar o pão num garfinho para banhá-lo num pote de queijo derretido virou sinônimo de breguice. Coisa de casais cafoninhas que se chamam por apelidos ridículos nos chalés de Campos do Jordão ou Monte Verde.
A bem da verdade, a fondue destruiu a própria reputação. (Refiro-me à fondue de queijo – fritar carne à mesa é um belo jeito de engordurar o cabelo e comer bife queimado.)
Fondue, via de regra, é uma porcaria. Nos restaurantes “de casal”, leva ingredientes de terceira e custa uma pequena fortuna. Os de caixinha são intragáveis, e você entende o porquê ao ler as letras miúdas na embalagem: queijos nacionais como prato e parmesão (a sobra do rebotalho, isso eles não especificam). As marcas suíças usam casca de queijo suíço, o que faz uma boa diferença – mas o custo não compensa.
O único jeito de se comer uma boa fondue é fazê-la em casa. É fácil. É divertido. Só não é barato.
Você vai precisar de bons queijos. A receita clássica leva proporções iguais de gruyère e emmenthal e, sinto dizer, as versões nacionais desses queijos estão abaixo da nota de corte. Existem os suíços, e são estes que você deve usar. Eles são caros de doer, mas às vezes entram em promoção – nessas ocasiões, eu os compro aos quilos, ignorando a data de vencimento aleatória.
Se a questão bolso apertar demais, há alternativas razoáveis. A fondue precisa de um queijo que derreta bem (o emmenthal) e outro bastante curado, salgado e pungente (o gruyère). Uma mistura de minas padrão e parmesão deve dar pro gasto.
Os queijos derretem dentro de uma panela com vinho. Vinho branco, seco e pouco aromático. Um chardonnay baratinho cumpre o papel.
Por fim, a receita demanda equipamento específico. Você pode comprar um kit fondue, com panela, espiriteira e garfinhos. Ou pode usar uma panela comum de ferro ou inox e um cooktop portátil de indução – pouco romântico, mas com controle preciso da temperatura.
Vamos à receita, em quantidades para um casal glutão ou dois que pretendem transar depois do jantar.
Ingredientes
300 g de queijo gruyère
300 g de queijo emmenthal
200 ml de vinho branco seco
1 dente de alho
1 dose de aguardente
1 colher (sobremesa) de amido de milho
Noz-moscada e pimenta-do-reino a gosto
1 baguete
O primeiro passo é ralar os queijos nos furos grossos do ralador. Para deixar tudo prontinho, pois o processo é rápido, também corte o pão em cubos. Procure afanar pouca comida na mise en place.
A tradição manda você cortar o alho ao meio, esfregá-lo no interior de panela e descartá-lo. Para mim, não acrescenta muito e é um desperdício de algo delicioso. Eu acrescento o alho ralado ou espremido ao vinho, dentro da panela. Você faz como preferir.
No fogão, ferva o vinho com a pimenta-do-reino e a noz-moscada raladas. Espere o álcool evaporar um pouco e reduza a temperatura – o calor muito intenso separa a proteína e a gordura do queijo, por isso não deixe a fondue ferver.
Enquanto o vinho ferve, dissolva o amido de milho em aguardente. Os suíços empregam kirsch, um destilado de cereja que aqui é difícil de se encontrar, caro e sem outra aplicação além da fondue. Tente um destilado branco de uva, como grapa ou pisco. Ou parta direto para a vodca. Cachaça é aromática demais para este uso, assim como as bebidas curtidas em madeira. Na falta de destilados, dissolva a maisena em mais um pouco de vinho branco.
Acrescente os queijos aos poucos, sempre mexendo com uma colher de pau. Quando estiverem completamente derretidos, jogue a mistura de aguardente e maisena. A função do amido é homogeneizar a mistura. Quando ele é pouco, queijo e vinho ficam separados; em excesso, acaba com o puxa-puxa do queijo (um clássico da fondue de caixinha).
A mágica demora um pouquinho a acontecer. Assim que a fondue se tornar uma mistura uniforme, desligue o fogão, e leve a panela para a mesa. O fogareiro já deve estar aceso neste momento.
Se usar o cooktop, oscile a temperatura entre 100 ºC (bem quente) e 60 ºC (para evitar queimar). No fogareiro, controle a chama para não torrar demais o queijo no fundo da panela. O fogo cria uma casquinha de queijo deliciosa, mas exige certa habilidade do piloto de réchaud. Caso contrário, a tão sonhada noite romântica pode naufragar miseravelmente.
Ao comer uma fondue boa de verdade, você irá perceber o quanto é cretino deixar de fazer certas coisas por medo de ser cafona.