Ficou a pé? Dê uma força para os restaurantes do seu bairro
Como integrante do painel que avalia restaurantes para o Guia Folha, sou obrigado a me deslocar para lugares tão longínquos e inóspitos quanto o Itaim Bibi e a Vila Nova Conceição.
Não me levem a mal. É só a percepção provinciana de um caipira do Cambuci, que emigrou para as Perdizes e obteve cidadania local. Não gosto muito de sair daqui.
Você, que de repente se viu sem combustível, sem a possibilidade de deslocamentos longos, deve enxergar ao menos uma oportunidade na situação. Aproveite-a para conhecer e prestigiar os restaurantes do seu bairro. É em momentos como este que se entende o valor desses estabelecimentos. Você ajuda a comunidade próxima e poupa a comida que estocou para o caso de piora na crise –toc, toc, toc.
Já fui mais aventureiro. Gostava de percorrer a cidade atrás de novidades. Cansei. Deve ser a idade, mas São Paulo carrega uma parcela de culpa pela minha preguiça. Prefiro assistir ao “Domingão do Faustão” a ter que viajar para Moema nos horários de pico.
Desde uns 15 anos atrás, quando comecei a trabalhar em Pinheiros, delimitei minha cidade particular. Ela tem como marcos fronteiriços os rios Pinheiros, Tietê e Tamanduateí, mais o parque do Ibirapuera. Raramente me arrisco em expedições para fora desta área –que engloba o centro, a Lapa, Pinheiros, região da Paulista e o Cambuci, onde ainda mora a minha mãe.
Minha cidade particular tem uns 700 mil habitantes. Uma Ribeirão Preto dentro de São Paulo, um pouco menos quente.
Quando passei a trabalhar em casa, reduzi ainda mais os deslocamentos. Faço a pé as coisas. Conheci meu bairro, onde já morava havia mais de 10 anos. E gostei do que conheci.
Como são poucos os que residem em vizinhanças como Pinheiros ou Leblon, faço uma observação: os critérios para avaliar restaurantes são outros. Poucas casas que atendem ao público local passariam pelo crivo crítico de quem exige excelência em produto e serviço.
Relaxe. Entenda que a conveniência pode ter um peso enorme na qualidade da experiência de comer fora.
Contemporize. Morar numa área com restaurantes de primeira linha traz uma série de perrengues colaterais. A perda do sossego é o pior deles.
Aqui no meu feudo, gosto de tomar café da manhã na padaria Nova Charmosa –careira, mas que emprega alguns dos chapeiros mais ninjas da cidade.
Compro queijos no Empório do Beto e na Bufalat; as carnes vêm do açougue Paraguassu, a 5 minutos da minha cama.
O bairro acomoda até algumas novidades. Caso da filial do Bullguer que vive lotada e já virou um favorito da família. Também da recém-aberta pizzaria Divina Increnca, amor à primeira vista na esquina da Itapicuru com a Franco da Rocha.
As opções de almoço não são tão variadas, mas é a cinco quarteirões do meu apartamento que se encontra a maior joia de todas: o bar e restaurante Sabor do Nordeste.
O Nordestão, como eu o chamo, tem sempre uma cerveja gelada me esperando. Posso chagar de bermuda e chinelo e ser atendido como um rei. O baião-de-dois, a feijoada, a galinha caipira. Tudo muito bom. E a costela com mandioca, o que é aquilo, minha gente?
Tem ainda um aquário com um peixinho dourado para fazer a felicidade do meu filho. Sem falar no espaço decorado com, digamos, obras de arte naïf. Gosto particularmente da plaqueta de madeira entalhada com os dizeres: “Proibido entrar bêbado, sair pode”.
No final, um picolé de uva para o moleque. E um cafezinho ruim, mas com rapadura de cortesia, para encarar a caminhada de volta.
Se eu recomendo o Nordestão? Sinceramente: não, a não ser que você more por aqui. Gosto dele, entre outras coisas, porque está perto de mim.
Vá conhecer o seu bairro e deixe o meu em paz.