Modinha da vez nos restaurantes, burrata é o novo tomate seco
Ele chegou chegando no comecinho da última década do milênio passado, quando o Brasil facilitou a importação de alimentos. Intenso, original e… italiano, o tomate seco foi sucesso imediato no corredor Jardins-Itaim. Naquele tempo, Pinheiros quase só tinha botecos para estudantes durangos.
Lembro-me de ter ido, em 1995 ou 96, a um restaurante chamado Filomena. A cozinha estava nas mãos de um cara mais ou menos da minha idade e que estava começando a fazer barulho, um certo Alexandre Atala. Fui atrás de um prato em particular, cuja descrição eu havia lido em alguma resenha: penne com creme de parmesão e tomate seco.
Não consigo imaginar Atala servindo um prato assim hoje, mas o macarrão estava fantástico. Aí o tomate seco foi parar na pizza, na esfiha, na empada, no risoto. Se já existisse temaki, teria ido parar lá também. Foi uma overdose de tomate seco. Uma fadiga tão grande que o coitado vai passar o resto de sua existência marginalizado.
Suspeito que a burrata esteja destinada à mesma trajetória de auto-destruição.
Caso alguém ainda não saiba, a burrata é uma bolsa de mozarela de búfala recheada com mais mozarela e com creme de leite, criada na região de Nápoles. Assim como o tomate seco, é deliciosa nas primeiras garfadas. Assim como o tomate seco, é tão intensa que enjoa rapidamente –às vezes sem volta. Assim como o tomate seco, virou a queridinha dos restaurantes da cidade e sofre superexposição.
Semanas atrás, visitei o restaurante Da Marino para avaliá-lo no quadro do Guia da Folha. Trata-se de um restaurante de frutos do mar: os mexilhões em molho de tomate estavam impecáveis.
Mas também se trata de um restaurante do sul da Itália. Rodolfo de Santis, o chef, é nascido na Apúlia e reproduz, no Da Marino, pratos de sua terra natal. Além dos peixes, o azeite e os legumes se destacam nessa culinária.
Quis então provar um rigatoni alla norma. A receita é siciliana: leva molho de tomate, berinjela e manjericão. Em sua forma original, é finalizada com ricota seca, defumada e picante.
A massa chegou com uma pelota de burrata por cima, sem a tal ricota. Não dá para dizer que ficou ruim, mas o caráter doce e amanteigado do queijo simplesmente não orna com uma comida assim. Parecia uma intervenção lombarda na macarronada da nonna pugliese.
Saí do restaurante com este post na cabeça. No dia seguinte, a burrata estava na matéria de capa do caderno Comida. Decidi esperar um pouco para não parecer provocação.