Os 7 pecados capitais da culinária brasileira

Para terminar a série de posts temáticos da Semana da Pátria, uma reflexão sobre os problemas da culinária nacional. Não me refiro à gastronomia dos restaurantes premiados, mas à comida que o brasileiro médio encontra quando sai para almoçar ou jantar.

 

1.Criatividade sem critério

A cabeça do brasileiro é uma Ferrari pilotada por um chimpanzé bêbado. Temos inteligência e criatividade, mas não sabemos trabalhá-las. A gastronomia é um campo em que isso pode ser observado com nitidez.

Está cheio de chefs jovens (outros nem tanto) com a cabeça fervilhando de ideias – ideias de jerico. Para criar, é preciso conhecer os elementos que serão combinados. É preciso ter sensibilidade para antecipar mentalmente o resultado da combinação. E, mais que tudo, é preciso ter perseverança para errar muito até chegar a um resultado satisfatório. Assim se acumula experiência.

O Cuoco brasilis acha que a centelha mental é o suficiente. Por isso, nossos cardápios estão lotados de invencionices bizarras.

 

2.Obsessão pela fartura

Para o brasileiro, mais é mais. A pizza será tanto melhor quanto mais coberturas empilhadas sobre a massa. O hambúrguer deve ser tão grande que não cabe no prato. O macarrão deve vir naufragado em molho.

Desconhecemos os conceitos de equilíbrio e frugalidade. Imitamos os norte-americanos naquilo que eles têm de pior.

 

3.Muito chef para pouco cozinheiro

“Para chegar ao topo, é preciso escalar a montanha”, já dizia Clarice Lispector em algum post de Facebook. O brasileiro quer pegar um helicóptero até o pico.

Ninguém quer lavar pratos, picar cebolas e passar por todas as funções dentro da cozinha até se tornar chef. A faculdade é um atalho. Os reality shows são outro. O status é o que interessa. Até chapeiro de padaria anda desfilando por aí de dólmã e crocs.

Temos uma multidão de chefs que não entendem como funciona uma cozinha. E pouquíssimos trabalhadores qualificados para executar as tarefas braçais necessárias em um restaurante.

Claro que isso não pode dar certo.

 

4.Desdém pelo produto nacional

Em uma viagem a Manaus, perguntei ao garçom do restaurante quais eram as opções de suco. A resposta: “Natural, só laranja e limão”. Todas as frutas amazônicas vinham congeladas em polpa.

Pagamos pau para a Europa. Pagamos pau para o lixo que vem dos EUA. Maltratamos metade dos ingredientes nativos do Brasil. Desconhecemos a outra metade.

A alta gastronomia investe em produtos e técnicas regionais, é verdade.  Mas a alta gastronomia é uma panelinha. Uma panelinha de pressão, que não abre nem a pau. No mundo lá fora, o que pega é nutella e cheddar.

 

5.As tendenças de anteontem

“Arriscar” é uma palavra tabu na culinária brasileira. São raros os que ousar fazer algo genuinamente criativo, diferente. Para garantir o risco mínimo, segue-se a manada que aposta em fórmulas consagradas no exterior. As hamburguerias. O lámen. O bolovo. O pão com abacate. O café de coador. A burrata. Ai, que sonozzzzzzzzzz…

 

6.Excesso de sal e de açúcar

Veio com a herança portuguesa e ficou. Nossos doces são melados. Brigadeiro, quindim, doce de leite. Fujam, diabéticos. Nossos salgados matam qualquer hipertenso. Dá-lhe sódio. Só percebemos essa característica da comida brasileira quando viajamos ao exterior e achamos a culinária local totalmente sem graça.

 

7.Tudo converge para São Paulo

O Brasil é um país gigantesco e muito diverso culturalmente (logo, também gastronomicamente). O problema é que o dinheiro está em São Paulo, e é para cá que vêm os caçadores de oportunidades.

A cena gastronômica paulistana é a mais relevante do país. O Rio, que era equiparável ao lado de cá da Dutra, sangra em praça pública. Cidades como BH, Porto Alegre, Curitiba, Recife e Belém têm destaques pontuais.

Imagina o que deve ter sido montar um restaurante como o Soeta, um dos melhores do país, numa cidade periférica como Vitória. O projeto só persiste porque há outra operação, de catering para empresas, para bancar as contas.

São Paulo, por ser a cidade mais populosa, deve se manter no topo do ranking gastronômico. Mas uma cena mais descentralizada seria muito saudável para o país.