As 10 mentiras mais comuns no cardápio do restaurante
Para seduzir clientes, muitos restaurantes abusam da licença poética na hora de redigir seus cardápios. O recurso estilístico pode se valer do uso de uma palavra mais pomposa ou de um storytelling com intenções ardilosas.
Nos casos mais graves, o vendedor oferece ao comprador um produto e lhe entrega outro.
Vale frisar que nem todos os restaurantes mentem nos cardápios. Entretanto, a lista abaixo relaciona práticas bastante comuns no setor. Tão comuns que, em muitos casos, o comerciante sequer se dá conta de que está ludibriando o cliente.
Saint Peter
O nome do peixe é tilápia. Saint Peter, para os anglófilos, e Saint Pierre, para os francófilos, são nomes estrangeiros criados para desviar a atenção do consumidor daquilo que ele de fato tem no prato: o peixe mais comum do mundo, que povoa desde o Nilo dos faraós até o laguinho do Parque da Aclimação.
Galinha caipira
Não é impossível comprar galinha caipira. Mas você precisará ir direto à fonte e tratar com algum sitiante que provavelmente nem licença sanitária tem.
As galinhas caipiras são criadas para botar ovos caipiras – outro grande sucesso no universo gourmetizado. Podem ser abatidas quando não cumprem mais a função, porém não existe um mercado estabelecido desse tipo de carne. Tente comprar galinha caipira em São Paulo. Não tem no supermercado nem nas avícolas dos mercados municipais.
O que se encontra à venda é o frango caipira, animal mais jovem, mais magro e de sabor menos intenso.
Muitas vezes, chamam de galinha ou de frango caipira a ave criada sem antibióticos. Não é a mesma coisa.
Cogumelos silvestres
O cogumelo silvestre – ou selvagem, ou ainda “do bosque” – nasce espontaneamente nas matas e é colhido junto aos troncos de árvores. No Brasil, esse tipo de extrativismo só existe em regiões remotas, como a Amazônia e algumas áreas do Sul.
O mercado de cogumelos de São Paulo é quase 100% abastecido com fungos cultivados. As exceções ficam para alguns produtos importados, para o cogumelo ianomâmi e para os porcini coletados em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul – mas esses aí são muito caros e chamados pelo nome próprio.
Quando um restaurante oferece cogumelos silvestres, ele entrega shimeji, shitake e qualquer outro cogumelo que não seja o champignon comum.
Azeite de trufas
Não leva trufas. Usa um aroma sintético. Trufas brancas custam uma fortuna. Se você não pagar uma fortuna, não são trufas brancas. Ponto.
Peixe do dia
Poucos são os restaurantes que operam com um esquema de compra diária de peixe. Dá muito trabalho e acarreta um nível de perda que pode comprometer a margem da operação (sem falar no desperdício de comida). Em geral, o “peixe do dia” é o peixe dos próximos 3 dias ou o peixe da semana. Tudo bem comê-lo. O problema é a expressão, usada com o propósito de induzir o cliente a pensar que vai levar uma comida escandalosamente fresca.
“Qual é o peixe do dia?”
“Salmão.”
Beleza, então.
PAUSA PARA O MERCHAN: agora você tem receitas exclusivas da Cozinha Bruta no Instagram. Acompanhe também os posts do Facebook e do Twitter.
Chocolate belga
É o mesmo caso do hambúrguer de picanha aí embaixo. Na mousse, no sorvete, no bolo ou na ganache, quem é capaz de identificar a origem do chocolate? Se ele é belga, suíço ou de Sorocaba? Certamente há os honestos, mas é impossível verificar.
Hambúrguer de picanha
Já decorri longamente sobre o assunto neste post.
Javali
Eu conheço somente um fornecedor de javali puro-sangue: a Cerrado Carnes. A carne do javali é mais escura, mais dura, mais magra e mais forte em sabor do que a carne suína.
Já cansei de ir a restaurantes, pedir javali e receber algo com a mesma aparência e o mesmo gosto do porco. Isso porque quase tudo do que se vende como javali é na verdade o javaporco, um híbrido que se adapta melhor ao cativeiro.
Aqui é preciso livrar a cara dos restaurantes: eles também compram o javaporco com o nome e o preço de javali.
Molho madeira
O vinho madeira, que dá nome ao molho, é um produto caro. Ninguém o usa para cozinhar. O que entra nos pratos é vinho nacional de quinta categoria.
Isso vale para qualquer bebida alcoólica de uso culinário.
Já entrei em dezenas de cozinhas de restaurantes. Mesmo os lugares mais caros e sofisticados usam “conhaque” de cana de açúcar para flambar as receitas.
Pizza de aliche
A aliche italiana é uma conserva do peixe Engraulis encrasicolus, que em português se chama biqueirão. O que as pizzarias usam é a anchoita argentina (Engrulis anchoita) ou mesmo a vulgar sardinha, filetada e conservada como se fosse anchova – a sardinha “anchovada”.