Pão com ovo, patrimônio da gastronomia

 

Revi outro dia a reportagem com o menino Darlison, uma obra-prima da TV popularesca brasileira. Darlison é um menino humilde da periferia de Fortaleza. Um menino com um sonho: uma festa temática de aniversário.

Vizinhos e comerciantes se mobilizaram numa vaquinha e deram a Darlison a festa com o tema escolhido: pão com ovo, da decoração ao bolo.

Emocionante.

Darlison é apaixonado por pão com ovo. Está certíssimo.

O pão com ovo é um patrimônio da gastronomia mundial. É bom, bonito e barato. Simples e excelente. Difícil competir com tantas qualidades.

Vão me acusar de incoerência. Fui amaldiçoado por dizer que o pão na chapa de padaria, dono do coração dos paulistanos, não é essa maravilha toda.

Sigo com essa opinião.

Para começar, a matéria-prima não é lá essas coisas: o pão francês. Pãozinho cheio de vento, de casca quebradiça, cheio de aditivos.

O pão é lambuzado com manteiga –ou (eca!) margarina– e levado à chapa quente ao lado de bifes, hambúrgueres, queijos, linguiça e cebola. A manteiga queima. Mistura-se a outros sabores.

Pão na chapa é um café da manhã bem mequetrefe.

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Um pão com ovo pode ser igualmente ruim, mas também pode ser sublime. Atingir os píncaros da excelência. Um ovo benfeito com um bom pão dispensa outros elementos. Mas estes surgem aqui e ali: bacon, presunto cru ou defumado, salmão, caviar, trufas.

Fiquemos com o modelo básico, sem acessórios.

O pão pode ser de trigo, de trigo integral, de centeio, de milho, de fermentação natural, brioche, baguete, bagel.

Os ovos podem vir cozidos, fritos, mexidos, assados en cocotte, mollet, transformados em omelete, em fritada italiana ou em tortilha espanhola.

Já me meti a fazer ovos pochê. Não recomendo. Dá um trabalhão. Você joga fora vários ovos até acertar. Às vezes nunca acerta. E o mais importante: ovos fritos são mais gostosos.

Eu sou fã incondicional do ovo frito por imersão, com bastante óleo quente, que leva a clara a borbulhar e pururucar. É ótimo com bife. Com arroz. No virado à paulista.

No pão, tenho preferido o ovo na manteiga. Frito lentamente em bastante manteiga sem sal, em fogo bem baixo, para não queimar. O sabor amanteigado toma conta da clara, da gema e do pão, besuntado com a gordura da frigideira.

Ovos fritos têm uma regra de ouro: a gema deve ser mole. Para escorrer, lânguida e pornográfica. Para chuchar o pão, ora pipocas. E para praticar a desobediência civil – a venda do ovo malpassado é proibida em todo o território nacional, por determinação da Anvisa.

Ovos com gemas duras deveriam ser reservados aos burocratas e políticos que inventam leis cretinas.