Prêmio para restaurante tem o peso de uma maldição

O colunismo gastronômico se alimenta de factoides. O desta semana, um dos mais importantes do ano, foi a edição 2019 do Guia Michelin, que classifica restaurantes de São Paulo e do Rio com até três estrelas.

Gritou-se muito nas redes sobre a queda dos restaurantes Fasano e Dalva e Dito –cada qual perdeu sua estrela solitária. Sei lá. Parece papo de ressentido. Vejo a coisa da seguinte forma: Rogério Fasano e Alex Atala são produtos dos anos 1990. Não vão continuar no topo para sempre. É a ordem natural das coisas.

Eu tenho as quatro patas atrás para essas premiações. Vale para restaurante, vinho, cerveja, qualquer coisa. Primeiro, não existe critério objetivo possível para se determinar o melhor da cidade (do país, do mundo) nisso ou naquilo. Vai do gosto do juiz.

Segundo, ser agraciado com um desses prêmios tem o peso de uma maldição. O sujeito nunca mais poderá ser o mesmo de antes.

Assim que a notícia se espalha, a procura aumenta. A tentação de aumentar os preços é quase irresistível –até porque ajuda a segurar a demanda. Expandir o negócio? Talvez, mas será que vale contratar um empréstimo? Muita gente arrebenta a fuça nessa história.

Eu temo principalmente pelos calouros da categoria “bom e barato”. No Guia Michelin, eles se chamam “Bib Gourmand”. É fácil deixar de ser bom, mais fácil ainda deixar de ser barato. E quando a pessoa descobre que o seu restaurante é bom porque é barato? Sinuca existencial.

Ainda que a premiação não traga grandes turbulências para a operação, existe algo chamado reputação. Retroceder nunca, render-se jamais, diria Jean-Claude van Damme. Perder território conquistado é trágico até para velhos de guerra como Fasano e Atala.

Na Europa, rebaixamentos no Michelin já causaram suicídios. Criaram também uma leva de chefs que se recusam a ser classificados pelo guia.

Guias são legais. Servem como referência em terrenos desconhecidos. Mas não devem ser levados demais a sério.

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