Gangue do crachá no pescoço causa terror em restaurantes da Vila Olímpia
Topei, ontem, com uma excelente charge do cartunista Arnaldo Branco, que satiriza o pôster do filme “Cães de Aluguel”, de Quentin Tarantino. Como você pode ver na imagem acima, os gângsteres receberam crachás e agora vagam pelas ruas na hora do almoço –dificultando o trânsito de todos os outros pedestres.
Essa é uma situação tão chata que eu quase –quase– me sinto feliz por ser desempregado.
Bandos de colegas saindo para almoçar são uma praga nas calçadas estreitas da Vila Olímpia ou no formigueiro de camisas Dudalina da região da Berrini, em São Paulo. A coisa se repete em todas as cidades grandes e médias do país.
O fenômeno merece uma série, não apenas um filme. Seguem os episódios da primeira temporada:
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O CHAMADO
Meio-dia em um escritório paulistano. Fred, o gerente contábil, desliga o computador e brada: “Vamos almoçar!?”. Murmurinho intenso no ambiente. Silvia, do jurídico, pergunta: “Mas onde?”. Murmurinho mais intenso. Após 40 minutos de confusão, o estagiário Wallister levanta a voz: “Podem ir vocês, eu trouxe um sanduíche!”. Murmurinho máximo. A tensão se alivia quando Sandra, do financeiro, toma a palavra: “Eu pago a sua parte, Wallister!”.
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LOUCURAS NO ELEVADOR
Todos saem em direção ao lobby. O elevador para. Está lotado. Não cabem os 14 colegas. O elevador para novamente. Agora só tem dois passageiros. “Espera, mas onde está o Robinho?”, indaga Fred, enquanto segura a porta do elevador. “Só um segundo, por favor”, ele pede aos dois homens no elevador. “Favor liberar a porta”, ordena a voz robótica do elevador. Mas Fred resiste. Dois minutos depois, as portas se fecham apesar do esforço de Fred, que quase perde um braço. Eis que Robinho surge ofegante, ainda abotoando as calças.
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A CALÇADA É NOSSA
Munidos de seus crachás no pescoço, Fred anda ao lado de Camila, que caminha ao lado de Edgar, que tem ao seu lado Marcela, Denise e Silvia. O paredão dos crachazentos ocupa toda a largura da calçada. Quem está atrás não consegue ultrapassar; quem vem no sentido oposto é obrigado a cortar pelo asfalto. Edgar pisa num cocô de cachorro e xinga o Universo. O grupo interrompe a caminhada e fica estático, rindo e conversando sobre assuntos fúteis. Fred acende um cigarro.
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ONDE ESTÁ WALLISTER?
Robinho, dos transportes, se dá conta de que só há 13 pessoas no grupo. Onde está o estagiário Wallister? Magda, a secretária do sr. Pedreira, é incumbida de guardar uma mesa no restaurante; o restante do grupo segue parado, bloqueando a calçada. Tentam ligar no celular do moço, mas cai na caixa postal. A tensão se agrava. Quinze minutos depois, Wallister aparece com um volante de loteria na mão: “A Mega-Sena acumulou, gente”. O grupo o interroga sobre tamanha demora. “Tinha a maior fila. E eu aproveitei para pagar as contas atrasadas do meu pai.”
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CAUSANDO NO QUILÃO
No restaurante, Magda está há quase meia hora guardando uma mesa para 14 enquanto o resto dos clientes, irritados, esperam em pé, segurando a bandeja com o prato. Os outros entram na fila do bufê por quilo. Marcela parece indecisa: faz que vai pegar alface, mas não pega; depois retorna para a couve-flor, põe no prato e devolve. Fred segura a fila porque daqui a pouco sai batata frita quentinha. Wallister se abastece com todas as comidas disponíveis no bufê: seu prato crava 1,632 kg na balança. A fila já dobra a esquina.
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O ANIVERSÁRIO DO CHEFE
Magda, a secretária, organiza um almoço em celebração ao aniversário do sr. Pedreira, o dono da empresa. O chefe, num raro episódio de generosidade, decide que pagará tudo para os funcionários. Os 32 trabalhadores se dirigem a uma famosa churrascaria. Marli, que é vegetariana, fica só no gim-tônica. Wallister, o estagiário, pede uma garrafa do vinho mais caro da casa e dá em cima de Denise, a amante secreta de Pedreira. Fred e Marcela desaparecem. Ressurgem horas mais tarde, no escritório, com os cabelos molhados. Wallister vomita no carro do patrão. Pedreira jura por tudo o que há de mais sagrado que nunca mais dará um almoço para os empregados.
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O RODÍZIO DE SUSHI
Sexta-feira, dia 5. O salário acabou de cair, e a turma decide fazer uma extravagância. Almoço no rodízio de sushi. Salmão até explodir por R$ 27,90. Edgar agradece o convite, mas não vai porque não come peixe. Na segunda-feira, só Edgar aparece para trabalhar: os outros estão internados com intoxicação alimentar aguda.
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A CONTA SEMPRE CHEGA
Depois do almoço na cantina Sappori Ditállia, chega a conta. Fred pergunta: “Posso dividir em partes iguais?” Carlos, do administrativo, protesta: “Eu não tomei cerveja nem comi sobremesa.” Marcela acusa: “O Edgar comeu filé mignon; todo o resto comeu massa.” Debate acalorado. Sandra do financeiro, assume a tarefa de calcular as partes individuais. O garçom chega com más notícias: é preciso pagar no caixa. A fila está pequena, mas se avoluma na medida em que cada um dos colegas calcula sua cota na boca do caixa.
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UM PICOLÉ E UM CAFEZINHO
“Tomamos um café aqui mesmo?”, pergunta Edgar, maliciosamente. Os outros caem na gargalhada. Ninguém fala nada, mas a resposta óbvia é “não”. O almoço dos colegas tem parada obrigatória no café Bule Dourado. O cafezinho em si é uma porcaria, mas os colegas têm a chance de conversar, relaxar, tomar um sorvete e retardar a chegada de volta ao escritório. Carlos pega o celular. Liga para um cliente: “Desculpe, houve um imprevisto e eu chegarei meia hora atrasado à reunião.”
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O ETERNO RETORNO
Como na ida, os colegas caminham lado a lado na calçada, sem deixar espaço para mais ninguém. Mas agora eles não têm pressa alguma, muito pelo contrário. Andam tão devagar que parecem se mover para trás, numa espécie de “moonwalk” bizarro. Alegando um mal-estar súbito, Carlos cancela a reunião com o cliente.