We speak Brazilian, make good feijoada
Uma das muitas coisas maravilhosas de morar no Rio de Janeiro é a presença de turistas de toda parte por toda parte. Eles estão no supermercado, na praia, no ônibus, na farmácia, no boteco, na fila do pão.
Argentinos são os mais altos, no que diz respeito ao volume da voz. Em Ipanema, é possível ouvi-los de longe, charlando com a característica melodia portenha –só os nativos da terra competem com eles na gritaria.
O xodó do carioca, entretanto, é o americano. O povo daqui faz tudo pelas verdinhas que habitam a carteira daqueles seres, gente geralmente rosada –mas cada vez mais negra, asiática ou latina–, que não fala um “bom dia” em português. É para o visitante made in USA que o comércio do Rio direciona sua energia criativa.
Os restaurantes da zona sul costumam ter cardápio em inglês. É aí que mora outra das muitas coisas maravilhosas de ser residente do Rio. O menu bilíngue, via de regra, é gargalhada garantida.
Muita gente ainda apela para o tradutor online. Nessas, alguns substantivos do português são transformados em verbos no modo imperativo. Lata vira “bark” (o verbo “latir”), mate vira “kill” (verbo “matar”). Só não dá para entender por que a fruta pera virou “wait” (verbo “esperar”).
A tradução dos produtos típicos do Brasil é particularmente problemática. Na falta de palavras exatas, o pessoal mete “Brazilian” qualquer coisa e manda ver. Mandioquinha –batata-baroa, em carioquês– é “Brazilian potato” num restaurante de Copacabana. No mesmo lugar, a singular jabuticaba recebe o apelido de “Brazilian berry”.
Em uma arapuca turística da orla, o feijão amigo (caldinho de feijão) é chamado de “bean friend”. O camarão casadinho –receita de Paraty com dois camarões gigantes recheados de farofa e unidos por palitos de dentes– se converte em pura poesia na tradução “happily married VG shrimp” (“camarão VG feliz no casamento”). O “VG”, no caso, significa “vermelho grande”. Nem quem é brasileiro entende.
A seção dos peixes guarda surpresas assombrosas para o estrangeiro incauto. O dourado –comum nos EUA, onde é chamado de “mahi mahi”– aparece num cardápio como “goldfish”. Daí o sujeito volta para a gringa pensando que somos selvagens e comemos o peixinho dourado do aquário.
É no capítulo das carnes que estão os grandes clássicos do menu carioca em inglês: “against the fillet” (contrafilé), “to the horse” (a cavalo), “campaign sauce” (molho campanha), “Oswaldo Spider” (filé à Oswaldo Aranha).
Um motel no caminho da Barra serve bife ao molho madeira, traduzido por “wood sauce” –“molho de madeira”, uma diferença sutil. Se o dono do lugar soubesse o que significa a gíria norte-americana “wood”, ele poderia vender o prato como afrodisíaco.
Iria faturar horrores –“stuff the butthole with money”.
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