Só o pão de queijo pode unir o Brasil
Semana passada, numa conversa com um chef topzerérrimo, tivemos a seguinte discussão: por que a cozinha brasileira não emplaca no exterior?
O chef apresentou um argumento interessante: o Brasil não possui um prato nacional, um ícone, um símbolo, um objeto de trabalho para os marqueteiros.
O tal prato deve preencher uma série de requisitos:
- Ser encontrado facilmente em qualquer parte do país;
- Ter tipicidade, algo que o diferencie de similares feitos em outros países;
- Ser replicável em outros países;
- Por último, mas não menos importante: agradar ao paladar estrangeiro.
O Peru fez um golaço com a promoção do ceviche. É uma preparação muito simples –não precisa nem de cozimento– e de fácil adaptação. Com um bom peixe, suco de limão, cebola e coentro, você tem ceviche. Não interessa que toda a costa pacífica da América Latina tenha o ceviche: o Peru fincou sua bandeira antes dos outros.
Os Estados Unidos têm o hambúrguer, que satisfaz perfeitamente todos os requisitos (se me disserem que ele foi inventado na Alemanha, eu respondo com um bocejo).
Portugal e o bacalhau (em suas múltiplas receitas) são tão conectados que os órgãos turísticos do país se esforçam para dizer ao mundo que há outras comidas por lá.
Sushi no Japão. A Itália tem um punhado: pizza, espaguete, lasanha. A França, então, nem precisa de UM prato nacional: ela representa a compilação e a ordenação das técnicas culinárias, permeando tudo o que é feito nas cozinhas profissionais hoje em dia.
E o Brasil? A gente não peca pela qualidade da comida típica nem pela falta de tipicidade, mas falta algo que una o país todo.
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Vamos aos postulantes:
É o que mais faz sucesso lá fora, porém sua expansão internacional encontra alguns obstáculos. Churrasco, ou carne na brasa, é uma modalidade de comida universal. Os argentinos estão numa briga feroz conosco pela hegemonia do churrasco na América do Sul. A excelência do churrasco brasileiro está relacionada ao Rio Grande do Sul, um pedaço de terra insignificante em relação ao país todo (assim como SP ou RJ). E o churrasco brasileiro é mais famoso pelo método de serviço –o rodízio “comer até morrer”– do que pela comida em si.
Brigadeiro
Falemos sério. Próximo.
É, de alguma forma, nosso prato nacional. O Brasil todo come e gosta, com poucas variações nas receitas regionais. Mas é muito difícil de reproduzir no exterior, por causa dos embutidos e da farinha de mandioca. E não cai no gosto de todos os estrangeiros –a aparência e a presença de pé, rabo e orelha de porco contribuem para um alto índice de rejeição.
Ao contrário da prima feijoada, tem aceitação universal. O Brasil todo faz e come. Só que não chega a constituir um prato. É, menos do que isso, um acompanhamento. Assim como a farofa, por sinal.
Moqueca
Os gringos a adoram, mas sua presença é restrita ao litoral e áreas banhadas por grandes rios. No interior interno profundo, peixe é luxo. Além disso, o preparo da moqueca –tanto a baiana quanto a capixaba e as outras versões– exige panelas próprias de barro.
Sobra pouca coisa. O resto é culinária regional.
O pão de queijo, entretanto, poderia ser elevado à categoria de prato de exportação.
É adorado no Brasil inteiro. Faz tempo que deixou de ser uma curiosidade regional mineira.
Todo mundo adora.
As adaptações de amido e tipos de queijo permitem a reprodução da receita sem grandes perdas. Além disso, misturas prontas (prefiro adaptar) já têm alcance global.
Falta dar um impulso na tipicidade e no sex-appeal do pão de queijo. Quase toda a América do Sul faz pães de amido de mandioca.
Minha proposta é avançar na trilha que já está sendo explorada por gente como a Manuelle Ferraz, da Baianeira, e Talita Barros, do Conceição Discos. Usar o pão de queijo como base para sanduíches de caráter 100% brasileiros.
Os colombianos fizeram isso com as arepas.