Ao fugir da comida japonesa, Bolsonaro ostenta ignorância e preconceito
“Peixe, só se for frito”. Este foi o comentário do presidente Jair Bolsonaro ao entrar em uma hamburgueria em Tóquio –em vez de mergulhar nas delícias típicas espalhadas pela capital do Japão.
A declaração não surpreende nem um pouco. Mas é muito didática.
Em poucas palavras, Bolsonaro expôs três de seus maiores atributos: ignorância, preconceito e preguiça intelectual.
IGNORÂNCIA
Bolsonaro parece convicto de que a alimentação japonesa se resume a peixe cru.
Senhor Presidente, os japoneses também comem peixe frito. Inclusive, se o senhor demonstrasse algum interesse, poderia ter pedido dicas de algum restaurante especializado em aji furai. Há muitos deles em Tóquio –nunca fui ao Japão, mas sei usar o Google.
Aliás, no Japão também se comem peixe grelhado, peixe cozido e peixe em conservas de vários tipos. Não tem lambari do rio Ribeira do Iguape, é uma pena.
Por incrível que possa parecer, a alimentação nipônica não se restringe ao peixe e ao arroz. Tem carne, frango frito, curry, um monte de legumes, tudo o que se possa imaginar. Os japoneses adoram carne de porco, frita (tonkatsu), ensopada (buta no kakuni), no recheio de guioza, no lámen.
Por falar em lámen, é uma sopinha de macarrão que virou moda mundial. Tem até na Barra da Tijuca, acredita?
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PRECONCEITO
O presidente estufa o peito para declarar a jornalistas que vai comer hambúrguer porque não gosta de peixe cru. (Aliás, como eu já disse em outro post, o hambúrguer é o refúgio do viajante covarde.)
Ele parece tomar a própria restrição alimentar como um traço positivo de sua conduta. Sem essa selvageria de comer peixe cru, pelo amor de Deus.
Não é a primeira vez que Bolsonaro trata os orientais de forma ultrajante.
Ao “confraternizar” com um asiático que não falava português, o presidente aproximou o indicador do polegar e gracejou: “pequenininho”. Ele disse a quem quisesse ouvir que japonês tem pau pequeno.
Quando foi anunciar sua turnê ao Oriente, Bolsonaro, aos risos, esticou os olhos com os dedos e disse que assim se misturaria à multidão. A mensagem: “japonês é tudo igual”.
É esse o homem que diz querer estreitar relações com o Japão em uma viagem oficial.
PREGUIÇA
Jair Messias Bolsonaro é aparentemente imune a estímulos externos que o levem a explorar e buscar conhecimento.
O sujeito está em Tóquio, com seus letreiros indecifráveis, uma miríade de imagens, cheiros e sons desconhecidos e um mar de pessoas que se vestem e se comportam de modo muito diferente do brasileiro. O paraíso de um curioso. Cada portinha esconde uma surpresa. Cada restaurante, uma delícia.
O que ele faz?
Vai comer hambúrguer, pois não dá conta de armazenar informação nova. Na sua preguiça, se refugia no que lhe é familiar. Além de bajular o bufão-mor Donald Trump, é claro.
Sem falar que alguém da idade do Messias já deveria ter aprendido a comer sushi socialmente. Principalmente quando se é um chefe de estado que viaja ao Japão. Mas ele não gosta e não arreda mão disso. Com tal postura, dá para entender os filhos que o homem tem.