A festa das domésticas brasileiras na Disney

Estive na Flórida em julho de 2016, numa viagem de trabalho paga pelas Indústrias Patinhas, com direito a acompanhante. Pois bem: o acompanhante era eu.

Na condição de papagaio-de-pirata, minhas atribuições se limitavam a deslizar no toboágua, comer e beber. Descobri, para meu espanto, que a culinária da Disney vai além da coxa de peru e da Coca-Cola no copo de três litros com refil perene.

Fui a jantares. Vários jantares que começavam lá pelas cinco da tarde e acabavam um pouco antes do anoitecer, perto das oito e meia, 32 graus lá fora.

Num desses compromissos, sentei-me de frente para um figurão –se a memória não me trai, era o vice-prefeito de Patópolis.

Vinhos de Napa, queijos de Vermont, filé mignon com isso, salmão selvagem com aquilo… o menu era espetacular. Entre uma garfada de magret de canard e um gole de cabernet sauvignon, o chefão me dirigiu a palavra: “Como está a política no Brasil?”

A sauna do verão em Orlando era refresco perto do tacho de óleo fervente em Brasília. Estava em curso a deposição da presidente Dilma Rousseff. Achei melhor desconversar para não azedar.

Mas outra brasileira não segurou a língua: “Vai mal por causa dos vagabundos do nordeste do país.” Mandei a prudência às favas, incorporei o Pato Donald e comecei a bater boca. Ao meu lado, apenas sorria a blogueira baiana que pouco entendia o idioma inglês.

Se o pau comia no jantar, no café-da-manhã a harmonia familiar imperava. Nosso hotel era top, mas tão top que o Mickey e o Pateta apareciam em pessoa (animal?) para tomar o “breakfast” com as crianças.

Tinha panqueca, waffle, bacon, presunto, linguiça e os célebres eggs benedict –na minha humilde opinião, a melhor releitura possível do pão com ovo. Todos os hóspedes se encontravam de manhã cedo, no bufê.

Adivinha quem eu encontrei por lá? Sim, elas: as domésticas de quem o ministro Guedes falou, numa festa danada com seus patrões, em tempos de dólar a R$ 3,30.

Era mole reconhecê-las. Tinham pele dois ou três tons mais escura do que o resto do grupo e sempre usavam roupas brancas. Só elas cuidavam das crianças, enquanto os pais bebiam mimosas e acompanhavam as coisas relevantes do mundo pelo celular.

Gozado que só os brasileiros presenteavam as empregadas com uma viagem à Disney. Russos, indianos, alemães, árabes… todos vigiavam os próprios filhos, apesar de milionários. Ô, gente sem um pingo de generosidade.

As babás também se divertiam a valer na piscina. De bermuda e camiseta, é claro. Vai que um ricaço italiano acha que a moça de maiô é hóspede pagante, se engraça com ela e a leva embora? Não é justo. Esses europeus não sabem o trabalho que dá treinar uma boa funcionária.

Ministro Guedes, peço que o senhor reveja a sua posição e trabalhe em prol de uma taxa cambial mais amiga. Trabalhamos duro pelo Brasil e precisamos relaxar nas férias. Cuidar dos filhos no exterior estraga todo o clima da viagem.

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