Quando Minas Gerais proíbe a cachaça, a coisa está feia
Nos Estados Unidos, muitos restaurantes não servem bebida alcoólica. Vários não possuem a licença específica para álcool. Em outros, o dono tem suas razões pessoais: religião, saúde ou apenas a visão de que o negócio funciona melhor assim.
Eu passo longe desses lugares.
Quando viajo a passeio, gosto de gastar meu tempo nas refeições, descansar as pernas das longas caminhadas na companhia de vinho ou cerveja. Se não tem, como qualquer coisa rapidinho e sigo adiante no passeio.
Álcool é uma droga social, junta as pessoas por horas e manda para as cucuias qualquer responsabilidade.
Por isso promete funcionar uma medida da prefeitura de Belo Horizonte, que proíbe a venda de bebida alcoólica em bares e restaurantes. As pessoas deixam de ir a bares e restaurantes. Não aglomeram. Essa é a intenção, ninguém tenta disfarçar.
As vozes reacionárias das redes sociais começaram a gritaria, chamando o prefeito Alexandre Kalil de “ditador”, de “tirano”, por tentar restringir a circulação da população.
É um discurso mal-intencionado, que tenta (e às vezes consegue) confundir emergência sanitária com voluntarismo autoritário. O uso do termo “lei seca”, popularizado com a longa proibição (de 1920 a 1933) nos Estados Unidos, contribui para disseminar a confusão.
A lei norte-americana era moralista, via a bebida como um desvio de comportamento. A proibição mineira busca conter o contágio de Covid-19 com uma estratégia pragmática: sem cachaça, os bares se esvaziam, não há vida noturna, não há aglomeração.
Os infinitos meses de pandemia já nos mostraram como fiscalizar as medidas de isolamento nos bares é ineficaz. Não tem equipe suficiente e não tem cooperação dos fiscalizados. Bêbado já é chato por natureza, bêbado negacionista é igual cavalo xucro.
Quem vê tirania nesse tipo de ação são os mesmos que se acham no direito de circular sem máscara. Dane-se se eles estão infectados e podem contaminar outras pessoas. O que importa é o sagrado direito de tomar uma cervejinha na rua.
Ninguém está proibido de beber em casa. Se a restrição funcionar e a taxa de contágio baixar, daqui a pouco os bares de BH podem voltar a servir birita. É um inferno, eu sei. Mas culpe a doença, não as medidas para tentar combatê-la.
Só não deixa de ser irônica a proibição de vender cachaça justamente em Minas Gerais. Quando isso acontece, o trem está mesmo feio.
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