Pornô culinário das redes sociais ainda vai matar a gastronomia
Fiquei viciadão no perfil de Twitter @insiderfood.
Eles mostram vídeos, a maioria de produção própria, de algumas das comidas mais peculiares do mundo.
Outro dia publicaram uma padaria de Londres que assa croissants coloridos, listrados como um arco-íris. O filminho mostra máquinas com rolos que esticam e juntam várias tiras de massa, cada uma com uma cor mais berrante do que a outra. O negócio é hipnótico.
O algoritmo do Twitter descobriu que eu tenho numa leve obsessão por pizza. Então o “Food Insider” me presenteia com as opções mais bizarras de pizza do planeta –fortemente concentradas nos Estados Unidos da América.
Tem um certo philly taco. Uma pizzaria da cidade de Filadélfia –que os gringos chamam carinhosamente de “Philly”– faz também um sanduíche de carne com queijo que é uma especialidade local, o philly cheesesteak. Daí enrola o sanduba numa fatia monumental de pizza, resultando num cilindro que remete vagamente ao taco mexicano. Grotesco. Mas eu encarava.
Outra pizzaria, esta no estado de Nova York, faz calzones gigantescos recheados com mais de 4 quilos de… macarrão. Imagine um pastelzão de 5 quilos, lotado de espaguete com almôndegas.
Dia desses, entrevistando um amigo gastroenterologista, ele me falou da importância de uma certa digestão cefálica. É a fase da digestão que ocorre antes de você comer. A visão e o cheiro da comida fazem a pessoa salivar e preparar o estômago para o trabalho que jaz adiante, entre outras coisas.
Daí a importância do aspecto visual dos alimentos.
Mas a pornografia gastronômica das redes sociais nada tem a ver com as preliminares do ato de comer. Ninguém fica com fome ao ver rolos metálicos girando em alta velocidade com tiras de pão cru multicoloridas, que se parecem com massinha de modelar.
É pura neurose, que anestesia e rouba sua inteligência por tempo o bastante para a máquina entender quais anúncios deve lhe mostrar.
A fixação pelo visual se tornou uma armadilha para quem trabalha na gastronomia. As redes sociais da internet são a principal ferramenta de divulgação dos pequenos negócios ligados à alimentação. Então, para o dono de restaurante, bar ou confeitaria, faz parte da estratégia de vendas criar uma paleta de produtos instagramáveis, tuitáveis e tiktoktáveis.
São os casos do croissant de arco-íris, do taco de pizza com sanduíche de carne louca e do calzone com um balde de espaguete.
Há também as cafeterias que fazem desenhos doidos na espuma de leite, as hamburguerias que empilham uma dúzia de discos de carne, as sorveterias que oferecem mil confeitos multicores.
O que vale é o espetáculo para as redes.
Essa é uma tendência da gastronomia –tendência que pode ser letal para a gastronomia, pois relega a qualidade da comida a um mero detalhe do show.
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