A grande fraude chamada alimentação funcional

Fez um bom barulho o artigo “Por que o ovo que te faz bem hoje te mata amanhã”, de Bruno Gualano, professor da Faculdade de Medicina da USP. Ele explica as falhas metodológicas dos estudos centrados no efeito de alimentos específicos para a saúde humana.

O ovo é o exemplo mais comum das distorções desses trabalhos: alguns dizem que ele faz bem, outros sugerem que ele é altamente prejudicial à saúde.

O que o professor demonstra, com sólidos exemplos, é o fato de que tais pesquisas ignoram a complexidade da alimentação: há mais de 250 mil alimentos que podem ser combinados de trocentas maneiras e proporções, o que torna dificílimo estabelecer o papel de cada um na saúde de um indivíduo.

Para piorar a confusão, fatores alheios à alimentação também influem muito: sedentarismo, tabagismo, depressão, enfim, tudo aquilo que chamados de estilo de vida. Gualano usa como exemplo estudos que atribuíam a incidência de câncer ao consumo de café –mais tarde, concluiu-se que o cigarro era o real culpado (caso você não saiba, fumantes adoram tomar um cafezinho antes de pitar).

O artigo deixa de abordar –e nem deveria abordar, por uma questão de concisão– dois outros aspectos da construção da mentira dos alimentos funcionais: o direcionamento perverso de muitos estudos e o papel da imprensa na propagação de mitos.

Uma coisa importante e largamente ignorada: nem todo cientista é isento. Dados científicos são manipuláveis, e isso é algo relativamente fácil quando há um universo gigantesco de pessoas incapazes de interpretá-los.

Nos Estados Unidos, principalmente, há um lobby muito poderoso para cada setor da indústrias alimentícia: leite, carne bovina, ovos, panificação e por aí vai. Esses lobbies financiam pesquisas para encontrar benefícios dessa ou daquela comida. Quando não encontra, o estudo vai para a gaveta. Quando obtém dados que podem ser interpretados da forma que o cliente gostaria, é feito um malabarismo retórico para destacar o benefício de beber suco de laranja ou de comer bacon.

E aí são disparados releases para a imprensa.

Então, numa redação qualquer, juntam-se dois personagens. O repórter que lê (quando lê) o estudo, mas não entende nada. E o editor louco para dar títulos que chamem a atenção do leitor.

A imprensa vive de novidades, e uma notícia que diz que macarronada ao sugo evita câncer de próstata é algo que todo editor adora. Pena que seja mentira.

Não adianta comer tomate, beber vinho, se entupir de chia e de amaranto para combater câncer, cardiopatias, colesterol e o escambau a quatro. Comida não é remédio. A alimentação funcional é uma fraude.

Na sua versão mais perversa, é a fraude que vende biscoitos recheados e sucos de caixinha, açúcar e gordura “saudáveis” devido à adição de vitaminas e outras tranqueiras.

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